Este é o primeiro artigo deste totalmente novo separador do blog: Vida Rural! Tem muito significado para mim, uma vez que representa a minha migração e as histórias que conto acerca dela.
Há cerca de cinco anos, começou a fervilhar na minha mente um desejo algo tímido de migrar, de sair da cidade e vir para a aldeia. Sonhava trocar a vista de betão e metal pela de árvores, montanhas e horizontes. A cada ano que passava esse desejo foi perdendo graus de timidez, até ao dia de hoje, em que o total descontentamento pelo que Lisboa me oferece, juntamente com o empurrão que o Covid-19 e consequente crise económica me deu, anularam por completo o medo do desconhecido e a resistência à mudança – tão típica do ser humano – e permitiram a minha migração.
Poderá ser algo paradoxal, pensar que no Interior existe desertificação devido à fraca oferta de emprego e consequente envelhecimento da população, mas que eu venho para cá empurrado pela Crise Económica. Qual é então a justificação?
Da maneira como vejo as coisas, para casais jovens com património familiar no Interior, sair das grandes cidades e voltar a habitar as antigas casas de família, construídas pelos avós, poderá ser a forma de finalmente ter alguma qualidade de vida. Basta pensar que estas são casas inabitadas, mas pagas, enquanto que em Lisboa e arredores, antes da pandemia, já não era possível arrendar um T1 por menos de 500€ e que esse valor subtraído num ordenado de 1000€, que é a média do que um licenciado consegue auferir nos dias que correm, representa metade do vencimento. Juntemos agora despesas de consumíveis e até uma viatura própria…Resultado: um ordenado para pagar contas. Isto é viver precário.
Outra questão que merece reflexão tem a ver com o legado: quantos de nós temos avós que trabalharam uma vida para construir património, argumentando teimosamente que este seria a garantia de um futuro para filhos e netos? Em que estado queremos deixar a memória destes, se pegarmos no seu património e o vendermos ao valor actual? 15000€ por uma casa antiga a precisar de carinho pode parecer um tentador prémio do totoloto, mas o valor de 50 anos de um crédito à habitação certamente também o será.

Enfim, a vida é feita de decisões e eu quero arrepender-me do menor número possível destas, por isso prefiro tentar a minha sorte onde me sinto bem e, se porventura esta decisão tiver sido errada, tomar outra, quiçá a de retornar à cidade, sabendo que pelo menos tentei.
Os amigos ficam em Lisboa, ao alcance de um clique, sabendo sempre que neste nosso pequeno mas belo país, a 300km de distância, têm uma porta aberta junto à floresta.
Em uma semana de vida por cá tenho já bastantes amostras da diferença que é viver aqui em comparação com Lisboa. Cada uma delas daria para ser esmiuçada no seu próprio artigo, porém dou aqui pequenos exemplos:
- A Internet é consideravelmente mais lenta! Se em Lisboa eu tinha fibra óptica com 200mb/s por cerca de 40€, aqui tenho internet 4G com televisão via satélite, a velocidades de 20mb/s por 33€. Pelo menos ganho uma desculpa para demorar a responder às pessoas
- Tudo aqui é mais longe, mas a menos tempo de distância. Se eu tiver de ir a uma cidade, tenho-as todas a cerca de 45km de distância, e a todas elas demoro cerca de 40 minutos a chegar. Em Lisboa, tanto poderia demorar 15 minutos a chegar à Costa da Caparica, por exemplo, como poderia demorar duas horas. É estranho pensar que não há problemas em passar duas horas no trânsito em Lisboa, mas há em fazer duas horas de viagem até ao Interior.

- Aqui parece que não há Covid. Este não é um ponto positivo! As gentes daqui são bastante descontraídas, demais até, ao ponto de ignorarem o distanciamento social e o uso de máscara, mesmo que estejam a lidar com alguém que veio recentemente de uma zona de pico de contágio. Nestas populações mais envelhecidas, surgir um pico de contágio pode ser absolutamente letal, e por isso quem cá chega deve ser duplamente cuidadoso.
- O ar é mais leve: Pode ser um efeito placebo da mudança para o Interior, um efeito da redução dos níveis de stress ou simplesmente um verdadeiro atestado da maior qualidade do ar que se respira, mas o facto é que eu sinto que o ar aqui percorre as vias respiratórias com muito mais facilidade!
- As pessoas querem o nosso bem, e recebem-nos com o melhor que têm para dar, sem esforço. Oferecem batatas por si cultivadas, alfaces, ovos, e qualquer coisinha que por lá tenham e nos possa fazer falta.
- Existe por cá tanto ou mais património cultural e paisagístico como em Lisboa, porém menos explorado e, nalguns casos, valorizado. É incrível como já visitei uma antiga mina de Volfrâmio perdida no meio de mato e silvas de dois metros, sem sinalização ou esforço de conservação, tendo esta tanta história por contar!

- Está-se cá bem. Assim, sem mais justificação.
Neste Separador, Vida Rural, espero mostrar que não existe vida apenas na cidade, ou no Litoral. Na aldeia, em meio rural, também existe vida, boas gentes e hipótese de progresso, não estivesse o Estado a incentivar à migração de jovens qualificados.
Venham comigo e partilhem um pouco deste meu gosto pelo que de bom aqui há!
Boa tarde,
Nasci aí e ainda ontem daí vim.
Obrigada pela suas palavras, consegue descrever exactamente o que grande parte de nós, que vivemos em Lisboa, sentimos quando aí estamos.
Ah se necessitarem de alguma coisa a sua sogra sabe que pode pedir ao vizinho lá de baixo!
Tudo de bom para si!
Ana Gamas
Muito obrigado Ana! Naquilo que puder ajudar, também podem contar comigo.
É tão bom ler-te sobre a nossa terra. Nossa sim, é tua também. O Vale é de quem o cuida, de que o aceita, de quem o valoriza e lhe quer bem!
Foi uma infância feliz, com sorrisos, tradições, amizade, felicidade, arranhões e nódoas negras. Falar do Vale é reviver sempre tudo com a mesma emoção de quando gatinhava no balcão da minha avó.. e a única tristeza, é a da partida, a de sair daí, passar a placa e afogar-me em memórias, misturadas com saudades e amor.
Eu desejo-vos toda a felicidade do mundo e que essa terra, rocha e alcatrão vos traga tudo aquilo que imaginaram, ou melhor!
Com ou sem COBIDE, eu vou estando por aí.. a acompanhar-vos no sushi, numa calzone e numas minis.
“Nessa terra toca o som do meu amor”
♡
Anita, obrigado pelas palavras! Um beijinho
Admiro a sua coragem, se necessitar de algo… disponha!
Obrigado José!