Domingo de manhã. Acordamos ao mesmo tempo e eu pergunto: “Sempre vamos andar de mota?”
Tinha sugerido sexta à noite todo um planeamento para o fim de semana, sendo que a mota estaria incluída no domingo de manhã. Deixei a ideia germinar, reacendendo a vontade numa ou outra situação pontual de sábado. A Marta foi sempre dizendo que sim, ainda que meio ressentida das difíceis férias que vivemos, como boa motard que é!
Eu sabia que a volta não podia ser longa! Sabia também que ela gosta de sentir que não está sozinha, em nada do que faz! Sei que ela gosta do ambiente motard: a despreocupação, a liberdade, o convívio e a circulação em grupo…ela nunca contém um “wow” quando faz parte de um grupo de motores ávido por puxar um par de rodas pelo asfalto fora!
Na minha cabeça a dúvida é apenas uma: Espichel ou Roca? Simples: eu quero o mínimo de exposição ao desagrado possível – quero recuperar o prazer de andar de mota aos olhos da Marta e que ela faça parte da minha vida enquanto motard, tal como quero que a mota faça parte da nossa vida enquanto casal – por isso o Cabo Espichel é má hipótese. Possíveis ventos laterais na ponte, calor que pode estar intenso na margem sul do Tejo, a distância que é longa. Cabo da Roca é a escolha vencedora, melhor ainda que eu procuro qualquer desculpa para ir a Sintra: Vila Romântica, de encanto por cada recanto, de frescura e excelente doçaria, que nem chegámos a saborear desta vez!
Vesti-me, passeei o cão e aguardei. Não há mota ou capacete que retire a vaidade a uma mulher, ou que alivie o homem daqueles minutos a aguardar com suspense pela sua amada, companhia para o seu dia.
IC19 fora, estamos em Sintra. A Marta ainda não sabe bem onde vamos, pois eu segui à direita onde geralmente viro à esquerda para passear na Vila, junto ao palácio. Inevitável é o cruzamento com o primeiro casal motard e o primeiro cumprimento, que fiz questão de ensinar à Marta, não fosse eu estar demasiado ocupado a manobrar a mota ou até a sorrir, pela alegria do dia!
Como não sorrir, se estou a andar de mota (algo que eu amo) com a Marta (aquela que eu amo) em Sintra (localidade que amo) sem pressa (raro durante o ano)? Como não amar, se constato o óbvio de uma situação óbvia, através da pessoa menos óbvia: Eu cumprimento um, dois, três e mais motociclistas sem resposta, até dizer em tom irónico, experiente da situação:
– Mal educados pá!
Ao que a Marta remata:
– Há quem só ande de mota, e depois há os motards.
Estou deveras ocupado, ao ponto de ter dores na bochecha, tal é a dureza da lavoura. Como não amar?
A quantidade crescente de motas que nos ultrapassa não deixa enganar: estamos a chegar! A minha surpresa resulta, logo ao cortar da curva pós farol, e sou brindado com um espontâneo e espantado “Eish!”. Como eu desejava ver a expressão dela! Senti naquele momento que uma mota peca por não permitir que os tripulantes se encarem…senti a saudade que se cria, apesar de uma proximidade palpável, satisfeita no momento de retirar os capacetes, com os pés no chão, fora da mota.

Paro a mota, deixo-a sair e começo a minha logística de tirar óculos, capacete e arrumar tudo. Quando acabo olho em volta, para encontrar a Marta na outra ponta do “recinto”, de telemóvel em riste, esse meu manómetro de sucesso! Se ela está a tirar fotos aleatórias, com histórias do Instagram à mistura e um sorriso na cara, só tenho de disfrutar, porque já a consegui agradar.
A Meca Motard da margem Norte ao domingo de manhã é um local especial, cujo oxigénio se respira de forma mais leve, ainda que ligeiramente temperado pela combustão de gasolina da centena de motos ali presentes!
Esta é uma tradição que se vive mais junto das R’s e Naked’s, que naturalmente preenchem a maior parte do espaço, mas é especialmente uma tradição de motards, e esses não distinguem estilos de mota, pelo que qualquer um que encaixe no perfil se sente em casa.
Qual é o perfil de um Motard? O Terra, Rocha e Alcatrão tentará explicar, mas se não sabes é porque provavelmente não o és…ainda!
Excelente💗